No ano passado, quando ainda havia indústria automóvel neste país, a Ana trabalhava a tempo inteiro e eu era doméstico.
Nesses dias felizes, todas as manhas eu punha as meninas na escola e esperava por elas à saída, a meio da tarde. Na altura, surpreendeu-me a quantidade de pais (na verdade, quase todas maes) com a mesma rotina. Entre as 9:00 e as 15:00, sobram apenas seis horas: o tempo mesmo à-justa para um part-time esforçado? Pela forma como ficavam por ali na palheta, ou seguiam devagar em grupinhos para o centro da vila, nao me parecia... Claro que nao havia Eva Longoria e duvido muito que tivesse havido qualquer crime, mas todo o cenário, personagens, adereços e diálogos faziam lembrar as Donas de Casa Desesperadas.
Ora eu (voces conhecem-me) olhava para aquilo como quem olha para a televisao: até gostava de ver, mas nao ia meter-me lá dentro! Fui cumprimentando quem me cumprimentava, fazendo alguma conversa de circunstancia, mas nunca entrando em pormenores, nao fossem as pessoas ficar à espera que eu lhes fixasse as caras, decorasse os nomes ou no dia seguinte ainda soubesse de que rebentos eram afinal os progenitores.
Agora que estou eu a trabalhar e a Ana (por assim dizer) em casa, tudo isto mudou radicalmente: nuns mesitos, a crise económica já fez mais pela nossa vida social do que Campo de Ourique em oito anos. Quem veja o calendário pendurado na cozinha ou repare na sua factura de telemóvel percebe facilmente que a minha mulher anda numa azáfama tao grande que, mais tarde ou mais cedo, vai ter que contratar alguém para lhe dar uma maozinha.
A escola organiza, no mínimo, uma actividade por semana, em que os pais sao convidados a assistir ou participar: reunioes, convívios ou celebraçoes. A associaçao de pais e amigos da escola tem, naturalmente, o seu próprio programa alternativo: a noite do conto, a sessao de Quizz, o workshop de maquilhagem e cabeleireiro. A maior parte destes eventos é acompanhada por rifas, chá e bolos, que sao feitos, oferecidos e depois comprados pelos participantes: é tudo para a caridade, garantem-nos. Muito gostam eles da caridade; nós também, embora nao ao ponto de ficarmos a depender dela.
Mas, enfim, há pelo menos duas coisas que a Ana e as amigas fazem exclusivamente a pensar nelas.
Uma é o clube do Jamie Oliver. Eu sei que parece engraçado, porque o menino está na moda. Percebo que as senhoras gostem tanto dele, porque tem uma cara laroca, porque sabe cozinhar ou porque fala pelos cotovelos. O que me custa a aceitar é que se reunam em casa umas das outras para ver a revista dele e comprar por catálogo os acessórios de cozinha que ele supostamente recomenda. E desde já peço compreensao: se um dia vierem até cá e eu tremer ao servir-vos café num serviço de porcelana branca que podia ser do Ikea, é muito natural que seja do Jamie e tenha custado mais do que todo o recheio da casa.
9 comentários:
estou a ver, temos que mandar para aí umas caixas de douro!
olha que isso é maledicência, capacete! a inveja mata.
Este é o meu post favorito de todos os tempos! valeu a pena esperar...
Que exagero!
...tem dias que também se fala de shopping e de maridos ;)
Fantástico! Isso sim é ser dondoca!!! E com muito nivel! Bjs
e é assim que começam os boatos.
Ps: por favor perguntem ao capacete se está melhor do dedo. Obg
Então, capacete, estás melhor do dedo? Que chatice, anh? Deixa lá, vais ver que daqui a uns dias já nem te lembras... São coisas chatas, pronto, limitativas, mas podia ser pior, não é? Beijinhos e as melhoras
Arnage, a tua evolução não deixa de me espantar! Tás uma mulherzinha, é o que é! Primeiro, abstémia, depois o Champomix, e já chegaste ao Pinot Grigio!!! Isto é que é caminhar, ahn? E quando só gostavas de champanhe, que tínhamos todos que beber aquilo ainda que fosse com carapaus fritos??? Vês como valeu a pena insistir?
continuo a insistir que vou lá é pelos livros ;)
dedo? qual dedo?!
Enviar um comentário