sábado, 1 de janeiro de 2011

da medicina privada - II

De maneira que agora, aqui em casa, quem recorre a um médico privado é sempre olhado de lado.
Eu, por exemplo, acho que a Ana podia muito bem suportar as dores de dentes até irmos a Portugal e ofereço-me sempre para lhe marcar consultas gratuitas com o meu irmao. Só me deixei convencer porque cá no Reino Unido as grávidas e maes recentes tem direito a tratamentos integralmente pagos pelo Estado.
Já a Ana desconfia muito da necessidade e do real benefício dos tratamentos osteopáticos às minhas costas e, às meninas que perguntam por mim, diz sempre que estou «nas massagens». Acho que só se deixou convencer porque, em vez da Cindy ou da Sue, escolhi ser tratado pelo Tom.
O Tom é porreiro. Mas o problema nao é ele ser ou nao ser porreiro, o problema é ele ser um miúdo. Os jogadores de futebol ainda vá; agora quando os médicos sao tao mais novos, saudáveis e bem-dispostos que nós, torna-se difícil de engolir. Claro que a juventude do Tom tem vantagens: trabalha até tarde, está empenhadíssimo no caso, ouve-me com atençao e faz sessoes bem puxadas. 
Profissionalmente, nao tenho nada a criticar ao Tom. O que talvez ainda lhe falte é aquela maturidade, aquele  tacto na relaçao com o paciente, que só a experiencia ensina. Nomeadamente, acho chato ele ter um livro sobre anatomia equídea em cima da secretária. Que ele se interesse pelo assunto, nada contra; mas deixando-o ostensivamente à vista do paciente, corre o risco de transmitir a ideia que preferia estar a tratar cavalos em vez de pessoas, ou que está a tratar pessoas como quem trata cavalos.
Outro exemplo foi a lista de recomendaçoes que me fez depois da primeira consulta. Disse-me que nao podia carregar pesos, que tinha que passar a dormir mais horas, que devia tomar banhos de imersao prolongados e fazer exercício com regularidade. Nesse dia cheguei a casa uma hora e meia mais tarde do que o habitual. A Ana ouviu-me repetir a lista, passou-me o Miguel para o colo e comentou: «Acho bem. Vais começar a trabalhar em part-time, nao é?».
Eu, culpado que sou de usar este blog para fazer queixinhas da minha mulher, desta vez dou-lhe toda a razao. Entao isso sao coisas que se sugiram a um homem da minha idade, que trabalha oito horas sentado à secretária, que perde duas horas por dia em comboios e que tem tres filhos, um dos quais recém-nascido? Banhos tépidos e prolongados? Uma coisa é ser pago, outra coisa é ser um vendido!

3 comentários:

rantanplan disse...

Nisto tudo, o que me faz mesmo rir até às lágrimas são os banhos de imersão prolongados... Banhos de imersão prolongados!! Uma lavagem de dentes prolongada é um spa dentário, ó Tomzinho... És fresco, és... Noutro dia, os três cá de casa que conseguem bater à porta, bateram-me os três à porta enquanto fui num instantinho à casa de banho. E explicavam os seus assuntos através da porta fechada: semanadas, testes para assinar, bakugans perdidos em baixo do sofá. Será que aquilo da clonagem nunca mais anda?

JoanaM disse...

:) lindo!!!

arnage disse...

o Tom 'e ridiculo e ainda por cima existe mesmo. O capacete devia convida/lo para vir ca passar uma semaninha a casa ;)

...no outro dia achei que estava a tomar um duche em silencio e sozinha. Mal abri os olhos tinha um pirralho sentado no chao com os olhos muito abertos que disse de imediato "eu estou/te a ver"